O segundo semestre de 2025 confirma um padrão que já vem despontando desde o início do ano: a renda fixa se consolidou como porto seguro para os investidores brasileiros, enquanto a Bolsa de Valores — apesar de acumular alta de 24,3% no ano e de 2,3% em outubro — avança de forma concentrada e sustentada quase que exclusivamente por fluxos externos.
O contexto é conhecido: taxas de juro persistentemente elevadas, incerteza fiscal e uma economia que ainda regista uma inflação nos serviços acima da meta. A leitura dos dados mais recentes, porém, revela nuances que ajudam a compreender o comportamento do mercado e a forma seletiva como o risco começa a retornar às carteiras.
Segundo dados coletados e processados pelo DataBay, entre janeiro e outubro os fundos de renda fixa acumularam ingressos líquidos R$ 148,3 bilhõesconfirmando o domínio desta classe de ativos. A combinação de elevado carry e previsibilidade continua a atrair investidores, enquanto os multimercados e os fundos de ações continuam a registar saídas líquidas — R$ 74,5 bilhões e R$ 46,5 bilhõesrespectivamente.
As entradas pontuais nos multimercados em agosto e outubro refletem apenas ajustes táticos, e não uma recuperação estrutural do apetite ao risco.
Fluxo de Investimentos B3 de 25/jan a 25/out (em R$ mil)

Na Bolsa de Valores, o comportamento dos fluxos reforça a assimetria do mercado. Os investidores estrangeiros ainda são o principal impulsionador do apoio, com ingressos líquidos de R$ 23,5 bilhões no acumulado do ano, enquanto os investidores institucionais nacionais continuam a reduzir a exposição, com vendas líquidas acima de R$ 43 bilhões.
As pessoas físicas mantêm saldo levemente positivo, com R$ 6,3 bilhões, alternando meses de compra e venda dependendo do humor do mercado. Esta dinâmica revela que a recente subida do Ibovespa reflecte mais o comportamento do capital estrangeiro do que uma recuperação estrutural da confiança interna.
Curva de rendimento BrasilOut/25 vs Set/25

Fonte: Dados da B3 elaborados pela Plataforma DataBay
A curva de rendimentos ajuda a explicar o ambiente prudencial. Entre o final de setembro e outubro, os vértices curtos mantiveram-se praticamente inalterados, enquanto os vértices médios e longos perderam entre 15 e 25 pontos base. Este movimento indica uma redução moderada no prêmio de risco futurorefletindo o alívio parcial nas expectativas de inflação e a percepção de que a política monetária permanecerá restritiva por um período prolongado, mas com menor necessidade de aperto adicional.
A leitura é que o mercado reconhece um cenário de inflação sob relativo controle, mas entende — em linha com o comunicado do Copom de 5 de novembro — que a política monetária deverá permanecer significativamente contracionista por um período prolongado, até que haja uma clara ancoragem das expectativas e uma redução consistente da incerteza fiscal.
O BC foi explícito: as expectativas para 2025 e 2026 continuam acima da meta (4,5% e 4,2%), o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo e a inflação de serviços, embora arrefecida, continua resiliente. O Comitê considera que o nível atual de juros é adequado para garantir a convergência da inflação à meta e que a política precisará permanecer restritiva “por um período muito longo”. Ou seja, o ciclo de cortes ainda não começou e não há pressa para começar.
Circulando pelo mundo, nos Estados Unidos, o desligar Outubro interrompeu algumas publicações oficiais e tornou mais difícil medir o pulso da economia, mas os indicadores privados – como os PMI e pesquisas dos Feds regionais — indicam atividade estável, em linha com o observado no terceiro trimestre. As informações da ADP e dos pedidos de seguro-desemprego indicam que o mercado de trabalho continua a perder força, mas sem sinais de perturbação: a criação de empregos permanece moderada, o que tem permitido um ajuste gradual da inflação.
O IPC de Setembro confirmou esta tendência, evidenciando um abrandamento mais forte nos serviços, com uma taxa anualizada próxima de 2,5%. Diante disso, as projeções para o núcleo do PCE indicam 2,9% em 2025 e 2,2% em 2026, abaixo da mediana do mercado e das estimativas do FOMC de 2,5%.
Os ganhos de produtividade – cerca de 2% tanto na média de longo prazo como em 2025 – têm sido o elemento que mantém o equilíbrio da economia americana. A demanda por tecnologia, infraestrutura digital e serviços em nuvem, aliada aos bons resultados das grandes empresas do setor, apoia o crescimento e ajuda a afastar o risco de recessão.
No campo diplomático, o acordo entre Donald Trump e Xi Jinping representou um avanço importante: a China manteve as exportações de terras raras sem restrições e os Estados Unidos reduziram as tarifas sobre o Fentanil. O gesto ajudou a reduzir as tensões comerciais e a melhorar o sentimento global, com impactos positivos nos mercados emergentes.
Em linha com este cenário, o FOMC reduziu as taxas de juro em Outubro e indicou que novos cortes dependerão de um abrandamento mais visível no mercado de trabalho — uma decisão consistente com a resiliência da actividade e a convergência gradual da inflação. Na Europa, o crescimento esperado de 1,2% em 2025 será suportado pelos investimentos em defesa e infraestruturas na Alemanha e pela expansão consistente da economia espanhola, enquanto a França continua a ser um ponto de atenção, devido à instabilidade política e à dificuldade na aprovação do orçamento.
Voltando ao Brasil, o comportamento recente da economia reforça o quadro descrito pela política monetária. Os dados mostram uma moderação gradual da actividade, com um abrandamento do consumo e sinais mistos entre sectores. A inflação corrente apresentou melhora na composição, com menor difusão e aumento mais contido dos preços dos serviços, embora ainda acima do centro da meta. Esta situação permite algum alívio na percepção de risco, mas ainda não o suficiente para mudar o tom conservador do Banco Central.
Do lado político e fiscal, o ambiente continua desafiador. O governo tenta recuperar receitas após a derrubada da MP 1.303, mas encontra resistência no Congresso, o que dificulta o avanço de uma agenda de consolidação fiscal. A relação diplomática com os Estados Unidos avançou em gestos, mas sem desenvolvimentos económicos concretos. Esse conjunto de fatores — atividade moderada, inflação ainda resiliente e incerteza fiscal — explica a postura defensiva dos investidores nacionais e reforça a cautela do Copom em manter a taxa Selic em patamar contracionista por mais tempo.
O cenário que surge no final de 2025 é de aparente estabilidade, mas sustentado por fragilidades estruturais. O Brasil convive com juros elevados e confiança parcial, enquanto o ciclo global caminha para uma fase de política monetária menos restritiva. O rendimento fixo continua a ser o eixo racional das alocações e a valorização dos activos locais dependerá menos do fluxo externo e mais da capacidade interna para consolidar um quadro fiscal credível. Sem esta âncora, a trajetória dos preços dos ativos continuará a refletir cautela.
Autor: Guilherme Carlini Carter é economista e especialista em finanças, com carreira dedicada à análise de mercado e inovação em investimentos. Mestre pela FGV-EESP, é professor de Finanças da FGV e coordenador dos programas de Finanças da FBNF. Ele também é Diretor Geral da DataBay, fintech de inteligência de dados para o mercado de capitais, e presença constante em debates midiáticos sobre economia, renda fixa e investimentos.
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